Nos últimos 100 anos, diversos fatores e eventos têm sido interpretados como sinais dos tempos.
Guerras, catástrofes naturais, terror, indiferença, profetas e líderes para todos os gostos e fins, fome, crises econômicas, epidemias sem cura, fanatismo religioso... Quem mantém-se minimamente informado sobre o que acontece no mundo de hoje não escapa da dura realidade à sua volta. Porém, para muita gente, mais do que tragédias isoladas, os acontecimentos que costumam ocupar as manchetes significam algo muito maior: são sinais do fim dos tempos e da volta de Cristo, eventos profetizados na Bíblia. A uma certa altura, o noticiário pode até se confundir com palavras de Cristo registradas no capítulo 24 do evangelho segundo Mateus ou ainda com o conteúdo dos livros bíblicos de Daniel ou Apocalipse. Todos estes escritos sagrados apontam para um panorama de instabilidade, crises, tensões e catástrofes que precederiam o desfecho da História.
Apesar dos chamados “sinais dos tempos” poderem ser verificados, em maior ou menor intensidade, em diversas épocas, nunca houve a soma de tantos deles como neste último século. O desenvolvimento da ciência, por exemplo, é apontado na Bíblia como parte do panorama do fim. Pois nos últimos 30 anos, o conhecimento e a tecnologia deram um salto que supera, em muito, todo o conhecimento acumulado pelo homem até então. A Bíblia fala também em conflitos – e nenhum outro século foi tão violento quanto o 20, que além de legar ao mundo as duas Guerras Mundiais, assistiu a milhares de outros confrontos. Foi um tempo marcado por genocídios, como o que vitimou os armênios, massacrados pelos turcos em 1915, e o feroz embate entre tutsis e hutus em Ruanda, há dez anos. Ao todo, 200 milhões de pessoas morreram nas guerras e seus desdobramentos do século 20.
De acordo com as Escrituras, os tempos do fim seriam caracterizados, também, por
pestes de grandes proporções. Identificada nos anos 1980, a Aids já matou, em todo o mundo, cerca de 20 milhões de pessoas. E estima-se que haja, no total, mais de 40 milhões infectados. A fome, outro indício apocalíptico do fim, permanece como ameaça em pleno século 21. Em todo o mundo, quase dois bilhões de pessoas – um terço da humanidade – sofrem com severas deficiências alimentares. Além das desigualdades sociais entre os povos, colabora para a carência na produção de comida as prolongadas secas e devastações climáticas que, periodicamente, afetam as regiões produtivas – e jamais, como nos últimos 100 anos, tantas áreas férteis foram destruídas pela desertificação. O clima anda mudando, e muito. No último século, a Terra se aqueceu como nunca dantes. Em média, a temperatura global subiu meio grau centígrado, o suficiente para desencadear a extinção de inúmeras espécies animais e alterar substancialmente a temperatura dos oceanos.Guerras, catástrofes naturais, terror, indiferença, profetas e líderes para todos os gostos e fins, fome, crises econômicas, epidemias sem cura, fanatismo religioso... Quem mantém-se minimamente informado sobre o que acontece no mundo de hoje não escapa da dura realidade à sua volta. Porém, para muita gente, mais do que tragédias isoladas, os acontecimentos que costumam ocupar as manchetes significam algo muito maior: são sinais do fim dos tempos e da volta de Cristo, eventos profetizados na Bíblia. A uma certa altura, o noticiário pode até se confundir com palavras de Cristo registradas no capítulo 24 do evangelho segundo Mateus ou ainda com o conteúdo dos livros bíblicos de Daniel ou Apocalipse. Todos estes escritos sagrados apontam para um panorama de instabilidade, crises, tensões e catástrofes que precederiam o desfecho da História.
Apesar dos chamados “sinais dos tempos” poderem ser verificados, em maior ou menor intensidade, em diversas épocas, nunca houve a soma de tantos deles como neste último século. O desenvolvimento da ciência, por exemplo, é apontado na Bíblia como parte do panorama do fim. Pois nos últimos 30 anos, o conhecimento e a tecnologia deram um salto que supera, em muito, todo o conhecimento acumulado pelo homem até então. A Bíblia fala também em conflitos – e nenhum outro século foi tão violento quanto o 20, que além de legar ao mundo as duas Guerras Mundiais, assistiu a milhares de outros confrontos. Foi um tempo marcado por genocídios, como o que vitimou os armênios, massacrados pelos turcos em 1915, e o feroz embate entre tutsis e hutus em Ruanda, há dez anos. Ao todo, 200 milhões de pessoas morreram nas guerras e seus desdobramentos do século 20.
De acordo com as Escrituras, os tempos do fim seriam caracterizados, também, por
É claro que os autores bíblicos não possuíam elementos para descrever com detalhes eventos como o efeito estufa e o degelo das calotas polares, mas grande número de estudiosos, hoje, apontam tais danos como ameaça real à vida na Terra – ou seja, profetas como Daniel e João, milhares de anos atrás, sabiam muito bem do que estavam falando. A somatória de toda essa turbulência faz com que o Apocalipse seja o assunto da moda. Em nenhuma outra época o tema despertou tanta polêmica ou trouxe tamanha ansiedade. Os números deixam isso bem claro: o site de pesquisas Google registra nada menos que 110 mil páginas sobre o assunto – só em português. Uma pesquisa recente da revista Time e da rede de televisão CNN mostrou que 59% dos norte-americanos, ou 170 milhões de pessoas, acreditam literalmente no fim dos tempos e restauração de todas as coisas como descritos no último livro da Bíblia cristã, vivendo na expectativa da iminente volta de Cristo.
É também na terra de Tio Sam que surge uma nova mania editorial que vem fazendo sucesso entre os cristãos. Escrita pelo pastor batista Tim LaHaye e pelo jornalista Jerry B. Jenkins, os 12 livros da série Deixados para trás e suas variantes voltadas para o público infanto-juvenil e estudo bíblico venderam mais de 50 milhões de cópias até agora. Os dois primeiros volumes, inclusive, já chegaram à telona, transformando-se em grandes produções do cinema. No Brasil, não é diferente. Lançada pela editora United Press, a série, que na realidade é uma ficção romanceada dos últimos dias, quando o Anticristo – apresentado como um eficiente e carismático presidente da ONU – surge em meio ao misterioso desaparecimento de crentes em todo o planeta para causar a Grande Tribulação prevista na Bíblia, teve seu último volume, O glorioso aparecimento –O fim das eras, lançado há pouco. A expectativa é de que as vendas ultrapassem a de seus predecessores, que por sua vez, esgotaram diversas edições. Não é para menos que LaHaye foi apontado pelo importante periódico Evangelical studies bulletin como o líder cristão mais influente dos últimos 25 anos.
O fenômeno é tão grande que já está sendo chamado, jocosamente, de “indústria do juízo final”. “De fato, este é o assunto da moda e voltou com tudo depois dos atentados de 11 de setembro de 2001”, explica o sociólogo Ricardo Mariano, professor da PUC de Porto Alegre (RS) e especialista na análise do segmento religioso. Para ele, o contexto político mundial, em que a religião surge novamente como fonte de disputas e controvérsias, é o grande incentivador do interesse pelo tema. Um interesse que muitas igrejas transferem para o púlpito ou para seus grupos de evangelização e estudo. Mariano estima em 1 milhão, apenas no Brasil, o número de fiéis de denominações cuja mensagem se baseia na interpretação de profecias sobre o fim do mundo. É a escatologia – ou estudo dos acontecimentos do fim – em alta.
Ao pé da letra – É verdade que já houve diversas ocasiões em que os crentes olharam para o alto no que acreditavam ser a iminência do fim. Desde a Roma do tempo dos apóstolos, quando o imperador Nero perseguiu impiedosamente os cristãos, passando pela peste negra que dizimou populações inteiras na Europa medieval até exemplos mais recentes, como o do nazista Adolf Hitler, que chegou a ser considerado por muitos como o Anticristo, muitos fatos foram vistos pelos cristãos de então como indício decisivo do Apocalipse. Só que agora, pela primeira vez em 2 mil anos, é possível interpretar quase ao pé da letra várias passagens bíblicas. Para muita gente, antes de o Messias voltar, haverá uma restauração de Israel. Diversas correntes evangélicas chegam a comparar o povo judeu a uma espécie de “relógio de Deus”, cujo destino desencadeará a sorte do mundo. A própria parábola da figueira madura, contada por Jesus a seus discípulos, é tratada como referência a Israel. Pois bem, para vários grupos que defendem a tese de que vivemos, hoje, os últimos dias, a formação do Estado judeu, em 1948, foi o cumprimento dessa profecia, restando agora apenas a restauração espiritual.
A reconquista do lado oriental da cidade de Jerusalém em 1967, na Guerra dos Seis Dias entre israelenses e jordanianos, foi outro marco importante desse quebra-cabeças. Afinal, é aquela parte da cidade que abriga o local onde, segundo a profecia, o Templo deverá ser reconstruído. Mesmo com a Mesquita de Omar, uma das mais sagradas dos muçulmanos, ocupando a área, ativistas judeus volta e meia tentam colocar lá uma pedra fundamental e são duramente reprimidos pela polícia. Nos EUA, a mesma direita cristã que foi fundamental para a reeleição do presidente George W.Bush crê tanto na questão que apóia as mais agressivas políticas de Israel frente aos palestinos e demais povos árabes. Alguns, incitados pelos ataques terroristas a Nova York e Washington, chegam a defender a demolição da majestosa mesquita da cúpula dourada. Aliás, após os atentados de setembro de 2001, uma bizarra notícia deixou claro até que ponto vai a questão para algumas pessoas. Criadores de gado evangélicos montaram um fundo para patrocinar pesquisas genéticas que permitam a criação de um bezerro totalmente vermelho, cujo sacrifício seria necessário, segundo alguns rabinos ortodoxos, para Deus permitir a reconstrução do templo.
“Estes últimos 50 anos são na realidade uma linha ao longo da qual a Igreja tem andado nos últimos dois milênios”, diz o professor Carlos Osvaldo Pinto, reitor do Seminário Bíblico Palavra da Vida em Atibaia (SP). Ele explica que, para os escritores do Novo Testamento, como os apóstolos Pedro, Paulo e João, a época em que viviam já era o início do tempo do fim; um período que se iniciou com a ressurreição de Jesus. Ultimamente, tal processo tornou-se mais agudo, até para que se cumpram as profecias. “Sempre que a Igreja viveu nessa consciência, esteve melhor, pois permitiu que tal urgência a levasse a vivenciar os ensinamentos e a ética cristã”, analisa.
O fato é que a escatologia mexe com a vida de muita gente. Apesar de não existirem pesquisas sobre o assunto, estima-se que é grande o número de pessoas que crêem mesmo que o fim está próximo – uma fé que é normal para quase todos os evangélicos brasileiros. É o caso do casal Gilmar e Denise de Andrade. Membros da Assembléia de Deus em São Paulo, eles acreditam que as profecias bíblicas são o mais seguro guia que o homem pode ter em sua vida. Denise, hoje com 38 anos, lembra que sua conversão se deu graças às histórias sobre os eventos do Apocalipse contadas em um disco. “Desde pequena fui criada na igreja, mas acabei me tornando uma adolescente sem muito temor a Deus, daquelas que iam nos cultos só para encontrar as amigas”, recorda. Tudo mudou quando ouviu o antigo LP A última trombeta, que dramatiza os eventos narrados no último livro da Bíblia. “Aquilo me marcou profundamente. As descrições eram tenebrosas, especialmente dos eventos da Grande Tribulação”.
Já na opinião de Gilmar, 40, muitos ainda não perceberam o que está realmente acontecendo. “Estamos às portas do retorno de Cristo e os crentes não podem ser omissos; devem anunciar isso”, exorta ele, que já falou muito sobre o assunto com colegas na empresa de transporte em que trabalha. Ambos também destacam o desenvolvimento tecnológico que o mundo experimentou no último século como um dos mais importantes sinais dos tempos. “Coisas que antes só víamos em filmes hoje são realidade, como a identificação pessoal através da íris”, destaca Denise. “O desenvolvimento tecnológico será essencial para que o Anticristo possa controlar o mundo”, emenda o marido, convicto.
Panorama catastrófico – Dúvidas desse tipo não são exclusividade dos evangélicos. Periodicamente, surgem as mais diversas previsões e declarações sobre o assunto. Filmes sobre catástrofes e a destruição do planeta Terra são sucesso de público garantido. E não apenas aqueles com temática religiosa, como Deixados para trás, O Apocalipse e Megiddo. Os que falam de hecatombes como queda de asteróides ou terríveis mudanças climáticas, do tipo Impacto profundo e O dia depois de amanhã, são campeões de bilheteria. Este último trata de um tema bem contemporâneo: mudanças climáticas repentinas colocariam o planeta em colapso, com gigantescas inundações devastando países inteiros e o início de uma nova era glacial.
Apesar de teoricamente possíveis, aos olhos da ciência tais catástrofes são mais produtos comerciais do que possibilidades plausíveis. “É claro que um asteróide pode se chocar com nosso planeta, mas as chances disso acontecer são muito pequenas. Desastres ecológicos ou mesmo guerras nucleares são mais possíveis quando se pensa em um final apocalíptico. Cientificamente, a previsão é de que o planeta seja destruído daqui a 1 bilhão de anos com a transformação do Sol em uma estrela vermelha, muito mais quente”, sustenta o físico Marcelo Gleiser, professor do Dartmouth College, nos Estados Unidos. Autor de O fim da Terra e do céu – O Apocalipse na ciência e na religião, lançado pela Companhia das Letras, ele afirma que mesmo antes do cristianismo o homem já lançava teorias sobre o fim dos tempos e o destino da humanidade. “A grande maioria das religiões tem teorias sobre o assunto. Crer ou não, muitas vezes, é uma questão de pura fé”, diz.
Os estudiosos do tema calculam em mais de 40 as obras com viés apocalíptico na literatura judaico-cristã. Algumas com nomes sugestivos, como I Enoque e Apocalipse de Pedro. Apesar de conterem semelhanças com os textos bíblicos, a grande maioria delas é considerada tendenciosa ou mera falsificação (ver quadro à página XX). Do gênero, apenas os livros de Daniel e Apocalipse entraram no cânon sagrado. O problema, entretanto, parece ser mais quanto a possíveis interpretações do que quanto à validade dos dois escritos. “Elaborar complicadas posições escatológicas não era uma preocupação dos crentes no começo da Igreja – tanto, que os escritos dos apóstolos não defendem nenhuma das atuais posições. O mesmo se deu com os pais da Igreja nos primeiros séculos, que apenas aguardavam a volta de Cristo e falavam de seus sinais”, observa o professor Carlos Osvaldo Pinto. Segundo ele, a única crença unânime era o estabelecimento de um reino milenar de Cristo sobre a Terra. Isto, pelo menos até o século quarto, quando interpretações espirituais começaram a ganhar força. “As posições teológicas que temos hoje só foram desenvolvidas séculos mais tarde”, ensina.
“Quanto aos sinais e a preparação para a cena final, em geral, todos concordam, pois as palavras de Jesus são bem claras. As dificuldades começam quando se tenta entender o que vem em seguida”, opina Ingo Haake, editor da Chamada da Meia-Noite, editora especializada em publicações na área escatológica. No catálogo da empresa, destacam-se títulos sobre Israel, profecias bíblicas, temas do Apocalipse, além de farto material sobre correntes escatológicas. Basicamente, há três destas: os pós-milenistas defendem que a volta de Cristo só acontecerá após o período de mil anos – o Milênio narrado no Apocalipse – em que a Igreja e os judeus convertidos governarão a Terra. Já os amilenistas pregam que esse reino não é literal e que, quando Cristo voltar, estabelecerá a justiça eterna e transformará o planeta para sempre. Porém, a que encontra mais adeptos atualmente parece ser mesmo a dos pré-milenistas, para os quais Jesus voltará à Terra após a Grande Tribulação e reinará por mil anos em Jerusalém sobre todas as nações.
De acordo com a Bíblia, durante este tempo o diabo será preso e não poderá tentar ninguém. É durante o Milênio, também, que o povo de Israel será restaurado. Porém, entre os pré-milenistas há algumas importantes nuances. Alguns defendem que a Igreja passará pela Grande Tribulação de sete anos descrita no Apocalipse. Outros garantem que o Arrebatamento – quando a Igreja será tomada da Terra – acontecerá no meio daquele tempo. Há ainda os que ensinam que o Arrebatamento ocorrerá antes da crise. “A perspectiva pré-milenista e pré-tribulacionista é a que tem base bíblica, harmonizando o Antigo e o Novo Testamento, sem anular, distorcer ou interpretar mal as promessas de Deus dadas a Israel”, defende Haake. “Ela também é consistente com a história e os acontecimentos dos nossos dias. Estou convencido por passagens como I Tessalonicenses 1:10 que a Igreja primitiva também cria que o arrebatamento viria antes da tribulação”, acredita.
“Relógio de Deus” – Essa é justamente a linha que seguem obras como Deixados para trás, misturando uma realidade fantástica e detalhes sobre o futuro com ensinos religiosos, o que as torna bastante atrativas como forma de despertar o interesse pelo assunto, esclarecer os crentes e até evangelizar. “Há muita ficção nestas obras, mas existem também coisas que chamam a atenção pela fidedignidade às Escrituras, como a restauração de Israel”, completa Ingo Haake, adepto da tese de que a nação judaica e o que acontece com ela funcionam como uma espécie de “relógio de Deus”. Mas apesar do sucesso, nem todos concordam com esse tipo de literatura. Pelo menos, é assim que pensam os adventistas do sétimo dia, importante ramo do protestantismo para quem alguns livros podem mais confundir do que esclarecer. “Não há qualquer passagem bíblica que ao menos sugira um arrebatamento secreto da Igreja anos antes da manifestação gloriosa de Jesus em sua segunda vinda, e em ocasião nenhuma. O único arrebatamento dos crentes de que fala a Bíblia é aquele constante em passagens como I Tessalonicenses 4.16 e 17, que poderá ser qualquer coisa, menos secreto”, contesta o professor José Carlos Ramos, diretor de mestrado e doutorado do Seminário Adventista Latino-americano de Teologia.
“Esse texto nos fala de alarido, do grego keleúsmati ou ‘grito de comando’, voz de arcanjo, sonido de trombetas, mortos ressuscitando, salvos ascendendo ao céu... Que há de secreto aqui?”, indaga. Polêmicas à parte, o fato é que o Apocalipse é algo tradicionalmente envolto em uma densa aura de mistérios. O texto revelado a João em seu exílio na Ilha de Patmos contém inúmeros símbolos e elementos misteriosos – anjos, demônios, dragões, bestas, criaturas humanas com feições animalescas e seres viventes carregados de simbolismo. Há todo um panorama cataclísmico, com estrelas caindo do céu, terremotos, águas se transformando em sangue e daí por diante. Para muita gente, a simples menção do nome Apocalipse já incomoda, pois evoca uma expectativa trágica. Justamente o contrário daquilo que o livro procura passar desde a sua introdução – as boas-novas da revelação de um futuro abençoado e eterno que Deus mesmo estabelecerá para aqueles que nele crêem.
“Enfatizar a realidade destas coisas é fundamental, pois nos permite entender os reais objetivos de Deus para com a humanidade”, analisa o pastor Magno Paganelli, autor de ...E então virá o fim, publicado pela Editora Bompastor, no qual analisa os sinais da volta de Cristo e o cumprimento das profecias. “O Apocalipse lembra à Igreja sua responsabilidade de viver e anunciar a Palavra de Deus. É preciso que os crentes tenham a perspectiva do retorno do Senhor e da fundação do novo mundo que ele nos promete.” Para ele, mais importante do que acompanhar os acontecimentos, confrontando-os com o que diz a Palavra, é estar atento à dimensão espiritual do anunciado fim do mundo. “Não importa saber exatamente quando ele virá – até porque isso é do conhecimento apenas do Senhor. Mas nós, cristãos, devemos saber que toda a escatologia só tem significado quando sabemos, após tudo passar, a nossa vida eterna de fato começará”. (Colaboraram Carlos Fernandes e Claiton César)
Apocalipses para todos os gostos
Apocalipse é um termo grego que significa “revelação”. O livro bíblico que leva este nome foi escrito, provavelmente, pelo apóstolo João durante seu exílio na Ilha de Patmos, que atualmente faz parte do território turco. Ele foi mandado para lá devido à sua pregação cristã. Estima-se que João já era bem idoso por volta do ano 95 da Era Cristã, quando escreveu o livro. Seus textos proféticos guardam bastante relação com os de Daniel, que também foi incluído no cânon sagrado. Todavia, diversos outros escritos apocalípticos foram produzidos na Antigüidade. Entre os apocalipses judaicos, os mais famosos são I Enoque e o Livro dos Jubileus, escritos nos séculos 3 e 2 a.C. e que gozaram status de obras inspiradas junto às primeiras comunidades cristãs e a grupos como o dos essênios. Contudo, o caráter apócrifo de tais textos fez com que, no decorrer dos séculos, fossem considerados não-inspirados.
No primeiro, o patriarca que, segundo o Gênesis, foi tomado por Deus para não ver a morte passeia pelos céus, guiado por um anjo chamado Uriel. Esta entidade teria poder sobre o dia e a noite, além de manter em suas órbitas todos os corpos celestes. Na obra, Enoque tem uma visão na qual observa Deus descendo com dez mil anjos sobre o monte Sinai para comandar o julgamento de todos aqueles que foram infiéis às leis de Deus. Já Jubileus tem a autoria falsamente atribuída a Moisés, que teria recebido a revelação através de anjos quando estava no mesmo monte Sinai. Parece, à primeira vista, um relato refeito da trajetória da humanidade decaída, do Gênesis ao Êxodo. Porém, fala muito sobre o juízo de Deus, com base em sua lei universal, observada até pelos anjos nos céus, e também, de forma esquisita, contra aqueles que teriam deixado o verdadeiro calendário solar para andar de acordo com um corrompido calendário lunar.
Mas são os apocalipses cristãos que causam mais estranheza. Entre os mais famosos estão o Pastor de Hermas e os Apocalipses de Tomé, Pedro e Paulo. Sob forte influência gnóstica, corrente que espiritualizava exageradamente o cristianismo e afirmava ser detentora de revelações especiais, as obras são pródigas em fantasias. No Apocalipse de Pedro, Cristo alerta o apóstolo de que, no Juízo Final, uma grande escuridão cobriria o mundo e a água queimaria tudo que tocasse. Já em Tomé, quem rouba a cena são os anjos que guerreiam entre si em meio a uma chuva de sangue e sete dias de destruição sobre a Terra. Apenas no oitavo dia haveria bonança, com o ressoar de uma voz meiga e doce que libertará os eleitos. Já no de Paulo, não é número gnóstico 8 que tem importância, mas sim o 10, pois esse é o número de céus que o discípulo atravessa para se encontrar com Deus.
A besta e os impérios
O que há em comum entre o extinto Império Romano, os Estados Unidos de hoje e o Apocalipse? Muito, se forem ouvidos alguns intérpretes das profecias do fim do mundo. Diversos estudiosos comparam os EUA com o Império Romano de outrora e outorgam ao país um papel-chave no cumprimento das profecias bíblicas, como também o fazem a Roma e a Babilônia. Agora, tal comparação deixa o campo profético e subjetivo para ganhar ares sociológicos. A editora católica Paulus está lançando no Brasil o livro Jesus e o império, do anglicano Richard Horley, que traça uma série de impressionantes paralelos entre as características, o papel e a influência entre o antigo império dos césares e o novo, comandado por George W. Bush.
Já quem deseja conhecer um pouco mais os bastidores e como funciona a maior potência militar de todos os tempos, pode recorrer a Plano de ataque (Editora Globo), um primor do jornalismo investigativo. Escrito por Bob Woodward, o célebre repórter que, através de suas matérias-denúncia, levou à renúncia o presidente Richard Nixon nos anos 1970, o livro baseia-se em 75 depoimentos e horas de entrevistas exclusivas com o próprio Bush e seus auxiliares diretos para reconstituir os 16 meses anteriores à Guerra do Iraque. Para quem tem alguma suspeita de que os EUA terá papel fundamental no fim do mundo, Plano de ataque é leitura obrigatória.
Sinais dos tempos
Diversos acontecimentos do século 20 têm sido interpretados como sinais dos tempos:
Guerras e rumores de guerras – O século 20 assistiu a duas grandes Guerras Mundiais e milhares de outros conflitos, que deixaram um saldo de 200 milhões de mortos
Fome – Dados da ONU apontam que, atualmente, 2 bilhões de pessoas sofrem com sérias carências alimentares. Só na África, populações em situação de risco alimentar são 70% do continente
Avanço da ciência – Desde que o mundo é mundo, a humanidade nunca acumulou tanto conhecimento como nos últimos 30 anos. A chegada do homem à Lua, em 1969, é considerada até hoje a imagem mais emblemática do avanço da ciência
Catástrofes climáticas – Desajustes ambientais provocados pela ação humana, como a poluição e o efeito estufa, põem a vida no planeta em risco
Pestes – Além do avanço das enfermidades infecto-contagiosas, sobretudo no Terceiro Mundo, doenças cardiovasculares e o câncer permanecem como principais causas de morte. A Aids, identificada pela primeira vez em 1981, já matou 20 milhões de pessoas e hoje infecta mais de 40 milhões
Restauração de Israel – A criação do Estado judeu, em 1948, costuma ser visto como cumprimento da profecia bíblica da figueira que haveria de frutificar. Para diversas correntes teológicas, a situação de Israel, sobretudo a construção do Templo que haverá de ocupar o espaço da Mesquita de Omar, é o “relógio de Deus” para o fim
Marcos Stefano
Jornalista da revista Eclésia
Fonte: http://www.eclesia.com.br/revistadet1.asp?cod_artigos=130
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